No mês de junho, participamos das aulas de pré-natal oferecidas pelo hospital onde estou fazendo o meu acompanhamento. Confesso que no início achei que seriam aquelas aulas para os pais ficarem amigos ou para ensinar a trocar fraldas ou a dar banho, cheias de blá blá blá. Nada contra, mas não estava muito animada não.
Mas práticos como são, no primeiro dia eles já avisaram que essas coisas a gente ia esquecer tudo e só ia aprender na prática e, por isso, iam logo direto aos pontos essenciais para podermos escolher o nosso parto e estar a par sobre como proceder no grande dia e depois também.
As aulas eram às terças-feiras no meio da tarde e me surpreendeu a quantidade de parceiros presentes. Quase todas as futuras mães estavam com seus companheiros, o que é bem legal, pois eles são atores importantes antes, durante e depois do parto e também receberam dicas sobre qual o seu papel nesse processo.
Enfim, a primeira aula foi sobre o reconhecimento dos sinais do trabalho de parto. Aqui você ouve muitas histórias de brasileiros chocados porque foram para o hospital e os mandaram retornar para casa, não só uma, mas duas vezes. E eles disseram que mandam voltar mesmo! Na verdade, o que eles acreditam é que você passando o primeiro estágio do parto em casa é muito mais confortável para a mãe. Eles recomendam ver um filme, almoçar, tomar um banho, dar uma volta e não se desesperar e sair correndo para o hospital, pois o processo é demorado mesmo e ficar numa cama, preso num hospital só bloqueará o desenvolvimento do trabalho de parto. Há exceções, é claro, se houver sangramento, se a bolsa estourar, aí sim tem que ir para o hospital direto. Caso contrário, eles recomendam ir para o hospital só quando as contrações tiverem de 3-4 minutos, durando 1 minuto!
Fizemos um tour pela maternidade e ela é separada por setores. Há a triagem, para avaliar quem já está na hora de ir para um quarto para começar o acompanhamento do trabalho de parto. E, caso esteja preparada, há três alas para seguir. Uma chamada Birth Centre, que é aquela para as mães que querem tentar parto natural, sem epidural. Os quartos são providos de piscina, banheira, aromoterapia, doulas e são as midwives (parteiras) que ficam o tempo inteiro acompanhando o processo. A outra ala é chamada Labour Ward, para aquelas mães que querem tomar a epidural e, portanto, requer uma presença médica. Mas, mesmo assim, as midwives estão presentes acompanhando todo o processo. E o centro cirúrgico, para os casos de cesária agendada ou de emergência, totalmente “médico”.
Eles disseram que depois que você vai para o quarto, demora, mais ou menos, em média, 12 horas até o bebê nascer. Pode ser que seja mais 6 ou 18 horas, não é regra. Bem, o bebê fica com você o tempo todo, a não ser que ele precise de ir para a UTI. Ele nasce, vai para o seu peito e depois eles cortam o cordão. Aí você fica no quarto individual mais 1 hora, para tomar um banho, e depois é transferida para a enfermaria, onde todas as outras mães estão com seus parceiros e bebês. Se o parto for normal e sem complicações, 6 horas depois você já pode ir embora (cesária é diferente, fica mais tempo).
Não tem aquela coisa que tem no Brasil, de um vidro onde as pessoas veem o bebê. Eles recomendam as famílias esperarem em casa. Visitamos o local e realmente não há condições para visitas. É tudo muito pre-programado para funcionar para todos e não há espaço para hotelaria, visitas e confusão no hospital. A ala comunitária estava cheia e confusa por si só, com as mães, os pais e os bebês. Imagina um monte de visitante lá??? (Se tiver que ficar mais tempo no hospital, por conta de alguma complicação, pode ter visitas, mas é limitado também!)
A segunda aula foi sobre os anestésicos que o hospital dispõe e os prós e contras de cada um deles. Esse tópico é super importante para as mães saberem quando podem pedir certos anestésicos e o que estão pedindo. Eles não recomendam de antemão nada, dizem que as experiências são muito pessoais e isso é uma escolha nossa mesmo. Eles dizem que na hora eles podem recomendar um anestésico ou outro, se verem que a grávida está num nível de tensão tão grande que não deixa o parto fluir.
A terceira aula foi sobre as complicações. Falaram, principalmente, da cesária, que aqui é vista como um caso extremo e às vezes é renegada por algumas mães, que sofrem por ter que fazê-la. Embora eles digam para planejar o seu dia e que o normal é que o bebê venha naturalmente, pois somos programadas para isso, temos que estar aberta para possíveis imprevistos e complicações e aceitar que durante o dia as coisas não sairão como sonhado e planejado.
Aqui eles esperam até a 42 semana. Na 41 semana, eles planejam a indução e começam a fazê-la as poucos, ao longo da semana. O último recurso é a ocitocina, processo iniciado na 41 semana e 5 dias. Eles dizem que tentam outros métodos antes, pois a ocitocina é muito agressiva e dolorosa, já que promove contrações artificiais. Fiquei surpresa quando eles falaram que cordão enrolado no pescoço não é indicação de cesária, pode estar até com duas voltas, que não impede o bebê de vir naturalmente. Sempre achei que não podia…
A última aula foi sobre amamentação, um ponto problemático aqui na Inglaterra. Aqui muitas mães escolhem de cara não amamentar ou não amamentam exclusivamente nos primeiros 6 meses. Eu sempre fico chocada quando, no sistema de saúde, me perguntam se pretendo amamentar. Na minha cabeça, não havia escolha, sempre achei uma pergunta óbvia, mas aqui não é. Alguns fatores estão associados a isso; primeiro, há uma vergonha de amamentar em público, várias mães se sentem constrangidas e amamentam escondido no banheiro e, segundo, pelo menos em Londres, por conta da vida mais prática e solitária dos moradores da cidade. Muitas mães tem filhos aqui sem suporte familiar algum, só do parceiro, pois as famílias moram do outro lado do mundo ou em outras cidade da Inglaterra. E tendo, desde a primeira semana, que cozinhar, lavar, passar e fazer mercado com um bebê recém-nascido, acaba-se optando pela praticidade e as fórmulas, já que aqui também não é comum se ter empregadas domésticas…
Nesse dia foi só para ensinar a forma correta de se amamentar, o que fazer se empedrar, como retirar o leite e o tanto de benefício para a mãe e bebê, tudo para estimular as mães a aderirem. Fomos informadas, que depois que saírmos do hospital, passaremos a receber visitas em casa de uma midwife comunitária ou de um health visitor (agente de saúde), que acompanharão o crescimento do bebê, a amamentação e qualquer outra questão que envolva o cuidado dele nos primeiros meses (não sei a frequência e duração dessas visitas ainda…).
Finalizando, eu recomendo quem é de fora, e não está familiarizado com o sistema de saúde daqui, a participar dessas aulas. Para mim, foi fundamental saber exatamente como proceder e o que me espera. Informação não faltou!
Saímos de lá confiantes, eles passam segurança e encaram com muita naturalidade o parto. Numa das aulas, falaram “Gente, é o dia do nascimento do seu filho! Que dia importante! Se quiserem tomar no café da manhã um bolo com champanhe, fiquem à vontade. Abram um vinho no almoço, tomem uma taça, relaxem e celebrem! Algumas de vocês vão tomar drogas muito mais pesadas, então nesse dia tá tudo liberado, esqueçam as restrições dos 9 meses!”…hahahah…Felipe e eu ficamos imaginando a cena, eu com contração, pedindo para ele abrir um vinho e os nossos pais chocados achando que ficamos malucos de vez…hahaha!
Bem, na teoria tá tudo resolvido, agora é esperar o grande dia e saber se tudo vai ocorrer como o planejado ou será um caos total e o próximo post será para esculhambar o sistema público de saúde inglês…hahaha.
Último mês, aí vamos nós!!!
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Obs:
1) Uma informação importante é checar quais companhias de táxi levam mulheres em trabalho de parto para o hospital. Eles pediram para gente ligar antes e se certificar, pois algumas se recusam.
2) Repasso aqui a minha experiência de pré-natal no hospital onde faço acompanhamento; como as escolas públicas daqui, há boas e ruins, assim como hospitais. Então, de forma alguma, pretendo generalizar nada e dizer que tudo é perfeito na Inglaterra e tudo funciona aqui…
Tags:pré-natal; NHS; sistema público de saúde inglês